PINTURA NÃO É PINTURA NA OBRA DE ERNESTO BONATO.
Ele não pinta pessoas, mas seres afeitos a ter uma alma que às vezes desconhecem.
Ele descobre!
Ele pinta a alma de seres que nunca se miraram no espelho do Grande Espírito.
Seu imenso espírito de pintor encarna todos os que ousaram pintar o outro além do Outro, desde os afrescos egípcios ou os de Pompéia nos olhando com aqueles olhos penetrantes animais a nos perguntar: 'Por que?', como hoje as crianças nos interrogam não aceitando tudo o que impomos.
Ele atravessa as pinturas/retratos cristãs ortodoxas nas cavernas da Capadócia, os ícones russos, ou as pinturas budistas de muitos templos na Índia, na China ou no Japão em completa cumplicidade.
Dessas pinturas, Bonato tem zelo pelo silencioso.
Ele conversa com Giotto pintando o santo de Assis como se fosse além de um santo; com Leonardo e seus São Joãos Batistas - e Salai, ao mesmo tempo - apontando silente o dedo para o nada; com Caravaggio e seus seres mundanos/sagrados no drama da luz lutando contra a escuridão do Mundo querendo ser renascentista; com Rafael e seu retrato do amigo Castiglione que lhe olha profundamente dizendo o que é de verdade e além, para o pintor e para o povo dos séculos que virão.
Ernesto passa por Vermeer e seus personagens a nos olharem com uma luz - entre espaços silenciosos - nunca igual em nenhuma pintura do ocidente; por Rembrandt, o magnífico, que pintou-se solene em pura luz em tantos autorretratos e nunca mais fomos os mesmos; no estupendo Van Gogh que pintou-se mais que a si mesmo, e seus autorretratos estão a nos perguntar: Qual é a sua cidadão? Que sonhos tens? Que viestes fazer aqui na Terra? Qual tua loucura e lucidez posta à prova?
Bonato é um raro testemunho, nunca indiferente, de seres que são veros e vastos. Os transcende usando a mais pura tradição da pintura para chegar à cosmovisão do Outro. Ele sempre estará pintando através e por meio de todas essas mídias/pintores, e, além da história da arte porque nunca fez só retratos. Só fará pinturas de almas que precisam se reconhecer como parte de uma humanidade que não tem só cara e identidade.
Jorge Luis Borges disse: As vezes numa tarde uma cara / nos mira desde o fundo de um espelho / A arte deve ser como este espelho / que nos revela nossa própria cara.
Ernesto vai no fundo do espelho de quem pinta e nos revela um ser que permanece no invisível, dorme no impalpável, medita no indizível e ama o incomensurável.
Eu fui pintado por ele e sei!
Eu sei de nossas conversas de tempo sem tempo, em dias e dias de mais do que só sessões de pintura e de sabedoria sobre música. Sem isso seria muito pouco e nada vasto.
Eu sei que nos tornamos irmãos, mais que amigos por esta pintura que fez de um urbano/indígena que estava a acolher de olhos abertos para suas limitações nas primeiras versões da obra. Bonato, fechou estes olhos para ver dentro de si, o que não era só ego e vaidade por ser pintado por Ernesto Bonato.
Gauguin disse: eu fecho os olhos para ver.
Ele notou o silêncio que ainda não posso, mas repousa fundo no poético do meu dentro.
Eu ainda estou a descobrir o que está ali além dos meus olhos cerrados. Talvez desencarne e não descubra. Talvez não seja para descobrir e seja para ficar só no cerne e carne de sua extraordinária pintura.
E como nenhum pintor vero faz só retratos na sua arte de transcender corpos, Bonato tem o mais sublime ofício: ele honra toda a história da pintura, da rupestre à contemporânea, sendo sempre o mais verdadeiro à sua própria cara de artista. Aquém e além de um espelho mero e cego.
Sua pintura nata clássica herética mântrica, pode não ser zen como ele medita, mas arte barroca pérola nunca perfeita: mas ele o é na meditação do pintar tudo o que pinta.
Ele se reconhece no silêncio...

Bené Fonteles

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